Carolina
Maria de Jesus nasceu a 14 de Março de 1914 em Sacramento, estado de Minas
Gerais, cidade onde viveu sua infância e adolescência. Foi filha de negros que,
provavelmente, migraram do Desemboque para Sacramento quando da mudança da
economia da extração de ouro para as atividades agro-pecuárias.
Descoberta
pelo jornalista Audálio Dantas, repórter da Folha da Noite, Carolina teve suas
anotações publicadas em 1960 no livro Quarto de Despejo, que vendeu mais
de cem mil exemplares. A obra foi prefaciada pelo escritor italiano Alberto
Moravia e traduzida para 29 idiomas. Em 1961, o livro foi adaptado como peça
teatral por Edi Lima e encenado no Teatro Nídia Lícia, no mesmo ano. Sua obra
também virou filme, produzido pela Televisão Alemã, que utilizou a própria
Carolina de Jesus como protagonista do longa-metragem Despertar de um sonho
(inédito no Brasil).
Quanto
a sua escolaridade em Sacramento, provavelmente foi matriculada em 1923, no
Colégio Allan Kardec, primeiro Colégio Espírita do Brasil, fundado em 31 de
Janeiro de 1907, por Eurípedes Barsanulfo. Nessa época, as crianças pobres da
cidade eram mantidas no Colégio através da ajuda de pessoas influentes. A
benfeitora de Carolina Maria de Jesus foi a senhora Maria Leite Monteiro de
Barros, pessoa para quem a mãe de Carolina trabalhava como lavadeira. No
Colégio Allan Kardec Carolina estudou pouco mais de dois anos. Toda sua
educação formal na leitura e escrita advêm deste pouco tempo de estudos.
Mesmo
diante todas as mazelas, perdas e discriminações que sofreu em Sacramento, por
ser negra e pobre, Carolina revela através de sua escritura a importância do
testemunho como meio de denúncia sócio-política de uma cultura hegemônica que
exclui aqueles que lhe são alteridade.
A
obra mais conhecida, com tiragem inicial de dez mil exemplares esgotados na
primeira semana, e traduzida em 13 idiomas nos últimos 35 anos é Quarto
de Despejo. Essa obra resgata e delata uma face da vida cultural
brasileira quando do início da modernização da cidade de São Paulo e da criação
de suas favelas. Face cruel e perversa, pouco conhecida e muito dissimulada,
resultado do temor que as elites vivenciam em tempos de perda de hegemonia. Sem
necessidade de precisarem as áreas de onde vem os perigos, a elite que
resguarda hegemonias não suaviza atos e conseqüências quando ameaçadas por “gente de fora” (leia-se, “gente de
baixo”). Essa literatura documentária de contestação, tal como foi conhecida e
nomeada pelo jornalismo de denúncia dos anos 50-60, é hoje a literatura das
vozes subalternas que enunciam-se, a partir dos anos 70, pelos testemunhos
narrativos femininos.
Segundo
pesquisas do professor Carlos Alberto Cerchi, Quarto de Despejo inspirou
diversas expressões artísticas como a letra do samba “Quarto de Despejo” de B. Lobo; como o texto em debate no livro “Eu te
arrespondo Carolina” de Herculano Neves; como a adaptação teatral de
Edy Lima; como o filme realizada pela Televisão Alemã, utilizando a própria
Carolina de Jesus como protagonista do filme “Despertar de um sonho” (ainda inédito no Brasil); e, finalmente, a
adaptação para a série “Caso Verdade”
da Rede Globo de Televisão em 1983.
Em
São Paulo, foi empregada doméstica, auxiliar de enfermagem, artista de circo. A
escritora deu entrevistas, ganhou prêmios, apareceu na TV. Deixou a favela,
recebeu as chaves da cidade. Mas seus livros seguintes não tiveram a mesma
repercussão. Logo seria esquecida. Já não era favelada, mas morreu no barraco
de um dos filhos. O livro Quarto de despejo vendeu 10 mil exemplares em uma
semana.
Contradição:
no dia do lançamento, teve de catar papel para garantir comida. Em maio de 1958
o repórter Audálio Dantas chega à favela para cobrir a inauguração de um parque
infantil. Fica intrigado com a mulher (Carolina Maria de Jesus, no caso) que
ameaça bêbados sobre os brinquedos: “Se
não saírem daí, vou colocá-los em meu livro!”. A obra de Carolina Maria de
Jesus é um referencial importante para os Estudos Culturais, tanto no Brasil
como no exterior.
Carolina
foi mãe de três filhos: João José de Jesus, José Carlos de Jesus e Vera Eunice
de Jesus. Faleceu em 13 de Fevereiro de 1977, com 62 anos de idade e foi
sepultada no Cemitério da Vila Cipó, cerca de 40 Km do centro de São Paulo.
Nicolau, estou a gostar muito dessa série de personalidades negras.
ResponderExcluirUm abraço
Ruthia d'O Berço do Mundo
P.S. Adorei a ameaça "saiam daí ou ficam registados no meu livro"...
Minha saudosa Ruthia é sempre uma honra ver que pessoas como você acompanham nossos trabalhos.
ExcluirTambém sou um leitor assíduo do seu blog. Gosto muito das publicações que abordam as belezas dos lugares que frequenta. Isso nos deixa com vontade de conhecê-los.
Forte abraço.