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Seis anos de golpe. Site-livro reúne documentários que registram o período

 

(FOTO | Reprodução/Democracia em Vertigem).

Em 31 de agosto de 2016, uma sessão do Senado concluía o processo de impeachment da presidenta Dilma Rousseff (PT). Desse modo, consolidou o que entrou para a história como um golpe parlamentar, jurídico e midiática pela ausência de crime de responsabilidade que o justificasse. Para resgatar os acontecimentos que estiveram por trás desta história, entrou no ar hoje (31) o site-livro Cinema Contra o Golpe.

O cinema brasileiro não demorou a dar sua resposta àquele atentado à democracia e ao Estado de democrático de direito. O site-livro é organizado pelo jornalista e escritor Carlos Alberto Mattos e reúne 90 textos sobre 44 filmes que registraram, analisaram, criticaram, denunciaram ou contestaram o que se passou no país desde as manifestações de junho de 2013. Para marcar o lançamento, Mattos, a cineasta Julia Mariano e o crítico Filippo Pitanga fizeram uma live no podcast canais do linguista Gustavo Conde.

Consequências

Entre filmes de observação, de explanação e de intervenção direta, esses documentários cobrem o período de 2013 a 2018. Aí se incluem as Jornadas de Junho, a operação Lava Jato, a perseguição a Lula, o processo de impeachment, o governo Temer, as revelações da Vaza Jato, a ascensão da extrema direita e a eleição de Jair Bolsonaro. As abordagens incluem os papéis do Congresso, do Judiciário, da mídia, das militâncias e de uma sociedade dividida entre a opção pela democracia e as tentações autoritárias que perpetuam o pensamento escravista e patrimonialista no Brasil.

Há produções de várias regiões do país e também algumas oriundas do exterior. Todos os 44 títulos abrangidos se posicionam contra o autoritarismo e o fascismo, ainda que alguns possam expor críticas à esquerda. Não estão incluídos os filmes produzidos pela extrema direita, que obviamente se colocavam a favor do golpe de 2016.       

A cada filme se referem de um a quatro textos de autores diferentes, entre críticos, jornalistas, pensadores e ativistas. Tal como os filmes, os textos também variam do simples comentário à discussão crítica e ao engajamento mais explícito.

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Com informações da RBA.

Uma enciclopédia para entender o golpe de 2016


As marchas carolas de 1964 foram reeditadas em 2015 como parte da estratégia do golpe.
(Foto: Paulo Pinto/Fotos Públicas).


Uma dezena de universidades públicas mobilizou-se para criar disciplinas sobre o golpe de 2016, seguindo a iniciativa do professor da Universidade de Brasília Luis Felipe Miguel. Na primeira aula, na segunda-feira 5, o cientista político explicou por que essa palavra é tão repelida justamente por aqueles que a puseram em circulação no Brasil.

Não foi só uma mudança em quem ocupa a Presidência. É uma mudança profunda, que se pretende definitiva, imposta unilateralmente e em desrespeito à lei por grupos de dentro do Estado, nas regras do jogo político. Em uma palavra: é mesmo um golpe”, escreveu o professor.
A academia começa a cumprir o seu papel, e é preciso dar nome aos bois, ainda que estes tenham o infortúnio de ser chamados de Temer, Cunha, Aécio ou Geddel. A esta altura do campeonato, só mesmo golpistas não admitem que Michel Temer é um presidente ilegítimo e o mandato popular de Dilma Rousseff foi roubado por eles.

Porém, a jornalista Maria Inês Nassif alerta no prefácio da Enciclopédia do Golpe - O papel da mídia que, se as futuras gerações se dedicarem a estudar esse período da história brasileira por meio do noticiário da imprensa comercial, certamente considerarão que tudo transcorreu dentro da normalidade institucional.
O que aconteceu é o que aconteceu: não existem duas versões para um Congresso que se reúne e depõe uma presidente legitimamente eleita e entrega o poder a um vice de passado nebuloso; não há duas interpretações para um Judiciário que condena inocentes inventando interpretações sobre textos legais que variam conforme o réu; não há duas visões sobre uma mídia que omite, esconde e manipula”, resume Maria Inês.

A obra de 251 páginas contém 28 verbetes escritos por profissionais e estudiosos da comunicação, cientistas políticos, filósofos e historiadores. Os capítulos tratam de temas variados, que vão desde uma radiografia do conluio entre jornalistas e o Judiciário, passando pela falta de democratização da mídia, o protagonismo político da TV Globo, a tomada das redes sociais por movimentos reacionários e a ainda influente agenda imposta pelos veículos tradicionais. O foco é a centralidade da mídia hegemônica, tida pelos organizadores da obra como a principal responsável pela narrativa dos acontecimentos.

“Indispensável a contribuição da propaganda inutilmente disfarçada de jornalismo para demonizar Lula, alvo maior da manobra golpista, reconhecido como principal entrave ao projeto de um Brasil-satélite no quintal dos EUA, país em demolição atado a instituições medievais, insignificante no plano internacional, exportador ainda e sempre de commodities”, defende Mino Carta, diretor de redação de CartaCapital, na introdução da enciclopédia.
“De fato, uma mídia empresarial totalitária, com força e decisão para capturar e ditar o rumo dos acontecimentos parece ter sido a principal engrenagem motora da ruptura da normalidade democrática”, anota o filósofo Bajonas Teixeira de Brito Junior, da Universidade Federal do Espírito Santo.
Para ele, é possível traçar paralelos entre a Marcha da Família com Deus pela Liberdade, que defendeu o golpe de 1964, com o que define como “pseudo ‘movimentos de protesto’”, como o MBL, Vem pra Rua e Revoltados Online, reeditando a estratégia golpista em 2015.

No conjunto, a enciclopédia presta-se a iluminar sombras de uma cobertura visivelmente negativa praticada pelos maiores e mais privilegiados veículos midiáticos. Ela é classista, por estar em defesa dos interesses empresariais das elites, e não surgiu com o impeach-ment. Mais de um autor defende que o golpe já vinha sendo fermentado desde que o PT assumiu o poder.

A Globo, com seus obedientes mervais, já vinha trabalhando desde o ‘Mensalão’, em 2005, para construir a ideia de que o PT inventou a corrupção no Brasil”, afirma o jornalista Rodrigo Vianna.

Autores dos verbetes descrevem a onipresença da emissora global para a “construção e disseminação de propaganda antipetista e antiesquerda”, segundo Maria Inês. “O processo de impeachment foi um jogo de futebol. A Globo passava a bola para a Folha, que deixava a Veja perto do gol, que tocava para o Sergio Moro completar de cabeça”, explica o jornalista Miguel do Rosário.

Essa triangulação só foi possível por haver um sistema midiático altamente concentrado no Brasil e cujo antídoto, a democratização dos meios de comunicação, jamais chegou a representar uma ameaça real às empresas.

Ora a imprensa atacava ferozmente o governo federal por aventar colocar em pauta esse assunto, ora Lula e Dilma não só recuavam como continuavam a favorecer as grandes corporações destinando generosos recursos por meio da propaganda oficial. Entram nessa combinação as revistas semanais Veja, Época e IstoÉ, como anota o professor Frederico de Mello Brandão Tavares, da Universidade Federal de Ouro Preto. “Em ‘tempos de golpe’, estas revistas (...) funcionam como gatilho para a pauta noticiosa. Vendem opinião como notícia.”
Outro verbete essencial é o caráter misógino do golpe. Para a socióloga Eleonora Menicucci, ex-ministra de Políticas para as Mulheres do governo Dilma, e a jornalista Júlia Martim, a mídia “estimulou em todas as oportunidades as críticas pautadas em questões comportamentais e não políticas”.

Esse conteúdo machista alimentou e fortaleceu um discurso de ódio, que acabou invadindo as redes sociais manipuladas por robôs, perfis anônimos e favorecendo a explosão das fake news, que também virou um verbete. “A imprensa brasileira faz parte da articulação de um golpe protagonizado por uma elite de homens brancos, declarados como heterossexuais e defensores de uma sociedade estruturada no patriarcado.”

Este é o segundo volume da Enci-clopédia do Golpe. O primeiro foi lançado em novembro e procurou explicar como cada um dos golpistas atuou em 2016. Escreveram verbetes, entre outros, os historiadores Luiz Alberto Moniz Bandeira e Fernando Horta, o ex-ministro da Justiça Eugênio Aragão, o economista Luiz Gonzaga Belluzzo (consultor editorial da CartaCapital) e o sociólogo Jessé Souza. (Com informações de CartaCapital).

Disciplina sobre o Golpe de 2016 se espalha e deve ser ministrada também pela UFBA e UFAM


A disciplina sobre o Golpe de 2016, idealizada pelo professor Luis Felipe Miguel na Universidade de Brasília (UnB) está se espalhando pelas universidades federais brasileiras.
Depois que a Unicamp reagiu à ameça de censura do ministro da Educação, Mendonça Filho, e resolveu também ofertar a disciplina para alunos de Ciência Política, mais duas universidades também irão ter disciplina sobre o golpe: a Universidade Federal da Bahia (UFBA) e a Universidade Federal do Amazonas (UFAM).

Na UFBA, 22 professores da área de Humanas se juntaram para oferecer a disciplina "Tópicos Especiais em História: O golpe de 2016 e o futuro da democracia no Brasil". A disciplina será oferecida pelo Departamento de História (FFCH-UFBA) e disponibilizada de forma eletiva para todos os departamentos e pós-graduações da UFBA.

Segundo a nota enviada pelo grupo de professores de História, Sociologia, Economia, Psicologia, Educação, Estudos de gênero, Ciência Política e Direito, a matéria está aberta ao público em geral, que poderá cursá-la como ouvinte.

Já na UFAM, a disciplina será oferecida pelo professor César Augusto Bulbolz Queiróz, do departamento de História, e deve abordar os seguintes tópicos: 1. Golpe de Estado, corporativismo e o legado autoritário da Era Vargas; 2. Golpes e contragolpes no breve período democrático (1945-1964); 3. O golpe civil-militar de 1964; 4. O golpe de 2016: autoritarismo, perda de direitos e reação conservadora.

Em nota ao site Manaus de Fato, o professor explicou a decisão de oferecer a disciplina. Leia abaixo:

Vivemos sob tempos sombrios. O avanço das forças conservadoras sobre o conjunto de direitos que haviam sido conquistados pelos trabalhadores se faz constante. A Reforma Trabalhista vulnerabiliza as relações de trabalho e nos impõe um retrocesso de 80 anos! A insistência do governo em realizar a Reforma da Previdência ameaça a aposentadoria de milhões de brasileiros. Tentativas de cerceamento das atividades artísticas e acadêmicas estão virando rotina. A exposição cancelada no Santander, a performance no MAM/SP, os protestos contra a visita de Judith Butler e, agora, a ameaça do MEC de proibição da disciplina ofertada pelo professor Luis Felipe Miguel, da UnB, demonstram que a democracia está em risco e que devemos reagir de forma enérgica contra essas constantes tentativas de censura e aos ataques à autonomia intelectual e às artes. Caso contrário, corremos o sério risco de ficarmos reféns de um governo que pretende silenciar as vozes dissonantes. É uma grave ameaça ao Estado de Direito e à Democracia.

Felizmente, em várias Universidades percebemos uma rede de insatisfação com tais arbitrariedades e de solidariedade com o professor Luís Miguel, sendo que muitos professores vêm ofertando – de forma individual ou coletiva – disciplinas que têm o objetivo de discutir os acontecimentos mais recentes e, ao mesmo tempo, demonstrar que a sociedade não vai se calar diante dessas tentativas de cerceamento de suas atividades artísticas, acadêmicas e culturais. Ademais, diversas associações como a Associação Nacional de História (ANPUH) e a  Associação Brasileira de Pesquisadores em Comunicação e Política (Compolítica) têm manifestado apoio ao docente e demonstrado seu repúdio à ameaça de cerceamento da autonomia acadêmica e às liberdades democráticas e constitucionais.

Neste sentido, considerando o contexto político vivenciado pelo país e a tentativa de cerceamento da autonomia universitária, ofertarei nesse semestre uma disciplina que discutirá o tema “Golpes de Estado, autoritarismo e repressão no Brasil Republicano”, buscando abordar, por meio da bibliografia sobre o tema, os golpes de Estado e as crises institucionais vividas no país entre os anos de 1930 e 2018. O objetivo é discutir a tradição autoritária estabelecida no Brasil e demonstrar que o golpe de 2016 se insere em um contexto de disputas políticas que podem ser analisadas na esteira de outras conjunturas de nossa história recente. Assim, dividi a disciplina em tópicos, nos quais pretendo analisar o corporativismo e o legado autoritário da Era Vargas; os golpes e contragolpes no breve período democrático (1945-1964); o golpe civil-militar de 1964 e o golpe de 2016: autoritarismo, perda de direitos e reação conservadora. Analisar de forma crítica a história recente do Brasil é sempre uma oportunidade de refletir sobre nosso presente. E, nesses tempos sombrios, é necessário repensar a importância da atuação do historiador em um momento em que as sombras do passado, fortalecidas pelas mentiras e omissões do presente, teimam em espreitar nossas janelas. Para Hobsbawm, “é comum hoje governos e meios de comunicação inventarem um passado. […] É vital o historiador lutar contra a mentira. O historiador não pode inventar nada, e sim revelar o passado que controla o presente às ocultas”. É bom lembrar isso quando discursos autoritários que  defendem a censura e as intervenções voltam a nos assombrar”. (Com informações do Brasil 247).

(Foto: Reprodução/ Brasil 247).